sexta-feira, 31 de julho de 2009

Sobre putas e lipos.

por Zezé Brandão


Em seu artigo semanal na Folha de São Paulo, o psicanalista Contardo Caligaris questionou o interesse de parte da imprensa italiana pela vida sexual do premier Silvio Berlusconi. O argumento dele, que detesta o Berlusconi, é que se as putas do homem não interferem na governabilidade do país, ninguém tem nada a ver com o que ele faz, ou não faz, entre quatro paredes.

Está aí embutido um questionamento que provavelmente surgiu junto com o Guttemberg: até onde a imprensa tem o direito de ir em se tratando de investigar a vida de pessoas públicas. E pior: até onde tem o direito de divulgar os fatos que descobre, às vezes por meios escusos, quando esses fatos não dizem respeito, não prejudicam ou nada significam em relação à atividade que tornou a pessoa relevante para uma determinada comunidade – seja uma sociedade, um condomínio, um país ou um clube?

É o caso da lipoaspiração do Ronaldo. Que ele se submeteu ao procedimento, parece ser um fato – vindo à tona sabe-se lá por que rede de indiscrições. Mas o que isso tem a ver com a performance do jogador, com sua capacidade, ou não, de fazer gols? O que a torcida do Corinthians e os leitores do Estadão e a favela da Rocinha e os moradores do Oiapoque (lá tem moradores?) têm a ver com isso?

Explicar a cirurgia da mão, contar os pinos, apresentar o cronograma da recuperação, sim, é obrigação da imprensa: a fratura se deu em campo, a consequência era o afastamento do cara de algumas partidas do Curingão. Portanto, o assunto, relevante para a torcida, para os fãs de Ronaldo, para o clube, merecia, como mereceu, ser detalhado, esmiuçado, publicado com todas as letras.

Mas a lipoaspiração? Francamente! Se ele não chamou a imprensa para uma coletiva, se ele não convocou as colunas de fofocas, se ele preferiu a discrição, que direito temos de questionar uma cirurgia estética hoje tão corriqueira e, pior, transformar um direito, uma escolha pessoal, em motivo de chacota?

Quando a Suzana Vieira, em pessoa, apresenta seu namorado de vinte e poucos anos à imprensa e diz que pretende ter um filho com ele, OK. Embora seja um fato irrelevante para a carreira ou para a performance dela como atriz, a simples decisão de querer que todos nós saibamos que ela namora um garotão é, em si, a notícia. Mas o Fenômeno se submeter a uma lipo em segredo não é notícia. É fofoca, velhacaria e pura e simples invasão de privacidade. Esse tipo de jornalismo antigamente era designado por uma cor: a cor marrom.


Zezé Brandão é publicitário, sócio da Limonada Publicidade e co-autor do livro A Vida Não é Um Limão, A Vida é Uma Limonada.

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