sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Se não passou pelo YouTube não aconteceu

Por: Zezé Brandão

Há tempos se diz que a vida imita a arte e vice versa. Hoje, de certa forma, a própria vida se transforma em arte no momento em que ela invade o you tube, é consumida e midificada (vai para a mídia).

Foi assim no episódio recente em que uma garota de vestido curtíssimo – iria direto para a balada depois – e sapatos altíssimos tentou assistir suas aulas do curso de turismo da Uniban antes de cair na night. Foi impossível cumprir seu dever de aluna. Acuada aos gritos de “puuuuta-puuuuta-puuuuta”, com a multidão (no caso, turba) de rapazes e moças à sua volta, teve de ser escondida e trancada em uma sala porque dos gritos de “puuuuta” passaram às ameaças de agressão física e ao extremo do estupro.

Psicólogos, psiquiatras, cronistas e até policiais passaram os últimos dias explicando ou tentando entender o que teria levado jovens “modernos”, pois universitários, antenados, posto que frequentadores de cursos “da hora” – nada da caretice de engenheiros ou economistas --, a agirem de maneira tão selvagem, tão censora, tão moralista como se fossem um bando de inquisidores prontos a levarem à fogueira uma mulher que pura e simplesmente mexeu com suas libidos reprimidas.

Não sei se as explicações, observações ou críticas serviram para alguma coisa. Não sei, e temo que não, se a moçada tirou alguma lição do episódio ou se pelo menos sentiu a vergonha que deveria acompanhar todo o grupo (uns 700, mais ou menos) pelo resto da vida por ter protagonizado algo tão repulsivo. Jovens capazes de tal barbárie me preocupam porque são o futuro do país. E me chocam porque a reincidência é alta demais nos desvios de coduta.

Mas de tudo, o que mais me chamou a atenção nessa história é que ela só chegou à mídia e à opinião pública depois de circular por quase uma semana pelo You Tube. Ou seja: uma menina é encurralada e moralmente estuprada pelo simples crime de usar um vestido curto demais num ambiente onde meninas usam saias e blusas curtas demais com toda a naturalidade (a protagonista deste caso deve ter usado também a maquiagem, o salto, o perfume que despertaram a ira das moças e o instinto animal dos moços) e o fato só chega a público porque celulares registraram as cenas atrozes e jogaram as imagens na internet . Quer dizer, sem o You Tube nunca teríamos ficado sabendo que dentro de uma universidade, na cidade mais rica, mais informada e locomotiva do país, está sendo chocado o ovo da serpente – consta que alguns funcionários participaram e deram força à “farra da moça de vestido rosa-choque”.

Bendita internet que às vezes serve para nos abrir os olhos. Mas perigosos tempos em que a vida real só vale, só é crível, só cobra providências, se for confirmada – porque aí, sim, acreditamos – pela realidade virtual.

Zezé Brandão é publicitário, sócio da Limonada Publicidadee co-autor do livro A Vida Não é Um Limão, A Vida é Uma Limonada.

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